A Ana passou os últimos meses a chatear-me a cabeça para a acompanhar a Barcelona. Ela ia lá participar de um curso e eu iria aproveitar a ponte do 10 de Junho para passar um fim de semana alargado. Estudei o caso e concluí que a viagem Porto/Barcelona/Porto me custaria perto de 50 contos....
Foi então que me lembrei do voucher do Paul... devia andar á volta de uns 30 contos, o que não era nada mau. Embora sempre tivesse imaginado investir o dote em algo mais significativo do que um fim de semana alargado, achei que ela valia a pena. E Barcelona é sempre Barcelona.
Assim, aproveitei o facto de ela fazer anos para lhe fazer a surpresa e confirmar que iria ter com ela no dia 10. Marquei férias no emprego e comuniquei-lhe a boa nova...mas ela não ficou contente. Ficou apreensiva. Não percebi.
Uns dias mais tarde, telefonou-me e sugeriu que eu adiasse a viagem. Que preferia que eu fosse uns dias para o Algarve para casa dela. Que ir assim a correr muito para Barcelona ia ser chato, além de que a colega com quem ela lá estaria teria voltar sózinha para Portugal no dia 11, e que ela mesma teria de telefonar ao laboratório que lhe patrocinara o curso e a viagem para alterarem o regresso de 11 para 14... E já só faltava uma semana para a partida e, e...
E eu senti-me mesmo muito mal.
Afinal eu teria de viajar para Barcelona sózinha e às minhas próprias expensas, e eu marquei férias a que ainda mal tinha direito ( ao fim de 3 meses no emprego)...e ela tinha andado meses a chatear-me a cabeça... E agora era assim? Desmarque-se!?
Disse-lhe que tudo bem, que desmarcaria as férias, mas que o Algarve não me interessava. Talvez não tivesse usado da minha voz mais doce, mas estava piursa, ao telemóvel e a conduzir numa rua cheia de polícia. " É para desmarcar, não é? Estou a ouvir-te muito mal. Depois falamos."
Entretanto ela viajou e nós não falámos.
Eu já tinha até comprado um guia para Barcelona, e metido na cabeça que poderia suportar a despesa com ou sem voucher. De teimosa, ainda pensei em ir. Enviei-lhe uma SMS a pedir o contacto do alojamento onde ela se encontrava. Ela não respondeu. Pensei que não tivesse recebido. Os dias passaram e a vontade de ir ao engano esfumou-se. Perdi a vontade. Afinal éramos amigas, confidentes e companheiras nas boas e más horas há mais de um ano...Preferi esperar que ela voltasse.
E ela lá deve ter voltado no dia previsto...deve ter voltado porque eu não soube. Ela não ligou. Nem na sexta, nem no fim de semana, nem nas duas semanas que se seguiram. Eu até pensei que lhe tivesse acontecido alguma coisa... Um dia, por descargo de consciência, liguei-lhe para o fixo...acho que tive receio que não atendesse se fosse pelo telemóvel. Ela atendeu e eu respirei fundo.
- Então? Só liguei para me certificar que estavas bem, que não te tinha acontecido nada. Nunca mais ligaste... - tentei soar fria e desafectada.
- Eu...estava a dormir. Esta semana não parei...
E na semana anterior? E a SMS, pensava eu, enquanto ela balbuciava qualquer coisa em tom de escusa. Não quis ouvir mais. Ela estava bem e eu podia descansar. Agora eu estava mesmo desiludida, mas estava em paz.
- Olha, tenho mesmo de desligar. Falamos noutra altura. Tchau.
E não voltei a ligar. Ela também não ligou mais. ... E pensar que quase gastei com ela o presente mais generoso que alguma vez recebera na vida. Nada disso. Tem de ser em algo especial.