domingo, setembro 12, 2004

Samaria Gorge(ous)


Não sabia nada sobre esta caminhada. Só que demorava uma média de 6 horas a percorrer e que deveria levar sapatos confortáveis. São assim os gregos, só te dizem o mínimo essencial, ou não se alongam nos pormenores. Por isso, entre as dezenas de caminhantes que se aventuraram desfiladeiro abaixo, se encontravam senhoras obesas e com pés pequeninos que se agarravam aos maridos para descer de uma pedra para outra.

Samaria Gorge é um desafio físico e mental, um exercício de atenção e um sacrificio para os músculos e as articulações das pernas, um prazer e um previlégio de estar tão perto de tanta e tão esmagadora natureza. Valeu cada passo.

Fiz a primeira parte do percurso um bocadinho acelerada com o único intuito de escapar ao pelotão de caminhantes. Aquele sítio não era para ser apreciado entre multidões. O sol da manhã, o vento que soprava nos pinheiros lá no alto, o som do ribeiro à distância mereciam alguma independencia. Dei graças pela boa forma física, pelos pés calejados do treino descalço, pela força anímica que nunca me abandona, e dei graças também por estar sózinha, podendo sair do percurso, avançar e parar quando eu bem desejasse.

O caminho foi pedregoso durante as 5 horas que me demorou a percorrê-lo. Pedras de mármore, polidas mas pontiagudas, algumas estáveis outras nem tanto. A preocupação de assentar bem cada passo, escolher bem a próxima pedra, torna-se tão dominante que não é possivel pensar em mais nada. Esvazia completamente a mente. Como um exercício de meditação. A poucas pessoas em torno também caminham em silêncio, perdidas nos proprios pensamentos, ou tão alheadas quando eu, mas todos reverentes de tão impressionante exemplo do mundo natural.

Às vezes forçava-me a mim mesma a parar e olhar em volta, olhar para cima, para as paredes de rocha que quase se fechavam sobre a nossa cabeça, a deter o olhar em cada pormenor da paisagem. As formações rochosas são impressionantes, as cicatrizes na rocha contam milhares de anos de história. Houve momentos em que desejei conhecer mais sobre geologia, e pensei em amigos meus cujo interesse pelo tema eu nunca havia compreendido antes. Agora sim.

A meio da viagem, chegamos a uma aldeia abandonada. Havia burricos para levar os mais cansados para baixo ou para cima.
Não lhes auguro grande viagem, em especial aos burricos. O trajecto é mesmo complicado, ou então existe um atalho que não nos foi revelado.

Há quem faça Samaria Gorge de Sul para Norte. Mas esses são os profissionais.

O final é a parte menos agradável. Subitamente o silêncio e a concentração dos nossos passos são interrompidos por turistas barulhentos que se passeiam pelos 2 quilómetros finais do desfiladeiro. E é estupido porque esta é a parte menos interessante, e eles só incomodam. Dá vontade de voltar para trás, para onde estes intrusos não se aventurariam, ou de chegar ao fim rapidamente antes que o encanto fosse quebrado.

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